domingo, 16 de março de 2014

O jejum

A marca fundamental da Quaresma — tempo litúrgico que estamos a viver — é a conversão: voltar-se para. Voltar-se para Deus é, necessariamente, voltar-se também para os outros e, ainda, voltar-se para dentro de si mesmo. A Quaresma é o tempo, por excelência do encontro: consigo mesmo, com os outros, com Deus.
Para isso, a Igreja propõe-nos alguns instrumentos importantes, como a oração, a penitência, o jejum.
É claro que todo o jejum (aquilo de que me abstenho) deve visar uma partilha com os outros. E convém que, sobre o jejum, não fiquemos apenas no sentido mais clássico de jejuar: abster-se de alimento, ou, pelo menos, de algum tipo de alimento. Mas nesta presente época de crise, que já nos obriga a viver muito mais modestamente, é possível pensar em novas formas de jejum.
Há quem, mesmo sem ser por convicções cristãs, por exemplo, semanalmente, desligue um dia o seu telemóvel: fica mais independente e livre para atender aos que lhes estão mais próximos, sobretudo a família. Chama-se a isto o “desliga-te”. Não se trata de gastar menos em chamadas. Trata-se, isso sim, de poder prestar mais atenção à família, escutando-se mais, estando menos dependente dos estímulos externos. Há, ainda, o “desliga-te” da televisão. Um dia por semana não há televisão. Há mais tempo para jogos em casa, para conversar com os filhos, com a esposa, com o marido, com os pais. Este é um jejum que nos pode tornar melhores: mais atentos aos outros, mais interactivos, mais humildes, mais pessoas. E aquilo de que nos abstemos reverte em favor dos outros. É uma partilha não monetária, mas cheia de valores, cheia de comunhão.
No seguimento da mensagem para a Quaresma do papa Francisco, devemos levar à prática o amor misericordioso de Deus por cada um de nós, dando mais tempo e espaço aos outros no nosso coração, na nossa vida: “A Quaresma é um tempo propício para o despojamento; e far-nos-á bem questionar-nos acerca do que nos podemos privar a fim de ajudar e enriquecer a outros com a nossa pobreza. Não esqueçamos que a verdadeira pobreza dói: não seria válido um despojamento sem esta dimensão penitencial. Desconfio da esmola que não custa nem dói.” (mensagem do papa Francisco). Nem que essa privação (jejum) seja de algo como a televisão, ou o telemóvel, uma vez por semana.

“Que Ele [o Espírito Santo] sustente estes nossos propósitos e reforce em nós a atenção e solicitude pela miséria humana, para nos tornarmos misericordiosos e agentes de misericórdia.”, diz o papa Francisco.

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